Durante muito tempo, imaginamos os neandertais como um ramo perdido da humanidade: parentes distantes, brutamontes da Era do Gelo que desapareceram misteriosamente. Mas uma nova investigação liderada por geneticistas e especialistas em inteligência artificial mostra que a história é bem diferente. Ao invés de um fim abrupto, os neandertais foram absorvidos por nós, modernos Homo sapiens. Eles continuam vivos, dentro do nosso DNA. Publicado na Science, o estudo revelou múltiplas ondas de cruzamentos entre humanos modernos, neandertais e até denisovanos, que ocorreram ao longo de cerca de 250 mil anos. Ou seja: não houve apenas um encontro casual: houve um verdadeiro vai-e-vem entre continentes, genes e histórias de vida.
Ao invés de esperar 200 mil anos para “sair da África”, como muitos modelos sugerem, os humanos modernos parecem ter migrado, voltado, cruzado com neandertais e denisovanos em vários capítulos ao longo da história evolutiva. A maior onda de contato genético aconteceu há cerca de 50 a 60 mil anos, mas as primeiras ocorreram bem antes disso. Essas migrações deixaram rastros genéticos. Com uma ferramenta baseada em IA chamada IBDmix, a equipe analisou os genomas de 2 mil humanos atuais, além de três neandertais e um denisovano. A surpresa? Mesmo populações humanas que se imaginava não terem DNA neandertal… tinham, sim. E os neandertais também carregavam genes humanos modernos.
Estudos anteriores superestimaram o tamanho da população neandertal. A diversidade genética que se acreditava ser “deles” era, em parte, herdada de humanos modernos. Com essa correção, o número de neandertais em idade reprodutiva cai para cerca de 2.400 indivíduos. Com populações pequenas, vulneráveis, e um contato cada vez mais frequente com humanos modernos, os neandertais foram aos poucos sendo incorporados — não extintos, mas assimilados. Isso redefine o que significa ser “humano moderno”. Carregamos pedaços de outros ramos humanos dentro de nós. A história da nossa espécie não é a de um grupo isolado e triunfante, mas a de uma rede entrelaçada de encontros, adaptações e fusões. Neandertais não desapareceram. Eles vivem em nós.
Link para o estudo: http://dx.doi.org/10.1126/science.adi1768
Conteúdo elaborado por: Dr. Caio Robledo Quaio, MD, MBA, PhD
Médico Geneticista – CRM-SP 129.169 / RQE nº 39130