Bloquear as enzimas PDIA1 e PDIA5 desestabiliza o receptor de androgênio e pode superar a resistência à terapia hormonal no câncer de próstata. Entenda o achado.

Fraqueza oculta faz câncer de próstata se autodestruir

Pesquisadores identificaram uma fraqueza oculta em um dos tumores mais frequentes entre homens: o câncer de próstata depende fortemente de duas enzimas, PDIA1 e PDIA5, para manter ativo o seu principal motor, o receptor de androgênio (AR). Quando essas enzimas são bloqueadas, o AR literalmente desmorona, as células tumorais entram em colapso e a resposta a medicamentos como a enzalutamida pode ser potencializada – desenhando um novo alvo terapêutico no câncer de próstata.

O estudo, publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), mostra que PDIA1 e PDIA5 atuam como verdadeiros “escudos moleculares” do tumor. Ao serem inibidas, essas proteínas deixam o receptor de androgênio desprotegido, favorecem sua degradação e levam à morte das células neoplásicas, inclusive em modelos resistentes aos tratamentos disponíveis. Em paralelo, o bloqueio dessas enzimas também atinge a produção de energia da célula, ampliando ainda mais o dano tumoral.

Um novo alvo terapêutico no câncer de próstata

O câncer de próstata avançado continua sendo um grande desafio em oncologia, em especial quando se torna resistente à terapia hormonal padrão. A via do receptor de androgênio é o eixo central da doença, e drogas como a enzalutamida agem justamente bloqueando esse receptor. No entanto, com o tempo, muitos tumores encontram caminhos para escapar, adaptando-se e voltando a crescer apesar do bloqueio hormonal.

A descoberta de que PDIA1 e PDIA5 são essenciais para a estabilidade do AR abre uma nova frente: em vez de apenas “desligar” o receptor, passa a ser possível desmontar a própria estrutura que o mantém funcional. Ao atingir essas enzimas, o tumor perde um suporte crítico para sua sobrevivência, o que pode ajudar a superar mecanismos de resistência que hoje limitam a eficácia dos tratamentos.

PDIA1 e PDIA5: muito além de um escudo do receptor de androgênio

PDIA1 e PDIA5 pertencem à família das protein disulfide isomerases, enzimas que atuam no retículo endoplasmático ajudando no dobramento correto de proteínas e na manutenção da homeostase redox. No câncer de próstata, o estudo mostrou que essas enzimas estão aumentadas e são induzidas pela própria sinalização do receptor de androgênio, criando um ciclo de retroalimentação que favorece o crescimento tumoral.

Ao bloquear PDIA1 e PDIA5, os pesquisadores observaram não apenas a instabilidade e degradação do AR, mas também sinais de estresse oxidativo, dano mitocondrial e colapso energético. Em outras palavras, essas enzimas ajudam o tumor a lidar com o estresse da sua própria proliferação descontrolada, funcionando como “ajudantes de luxo” para manter a célula cancerosa viva em um ambiente hostil.

Combinando inibição de PDIA1/PDIA5 com enzalutamida

Um dos pontos mais promissores do trabalho é a demonstração de que a inibição de PDIA1 e PDIA5 amplifica o efeito da enzalutamida. Em modelos pré-clínicos – incluindo amostras derivadas de pacientes e modelos animais – a combinação entre bloqueadores dessas enzimas e a terapia hormonal resultou em maior morte celular e redução tumoral do que a enzalutamida isoladamente.

Embora ainda estejamos em uma fase inicial, com resultados em laboratório e em modelos animais, a estratégia aponta para um futuro em que novos fármacos direcionados a PDIA1/PDIA5 possam ser associados às terapias antiandrogênicas já consagradas. O objetivo é enfrentar tumores resistentes e prolongar o controle da doença, com impacto direto na sobrevida e qualidade de vida dos pacientes.

O que isso representa para a medicina de precisão em oncologia

A identificação de pontos fracos específicos em tumores, como PDIA1 e PDIA5 no câncer de próstata, é um exemplo claro de medicina de precisão em ação: entender a biologia íntima da doença para desenhar combinações terapêuticas mais inteligentes. No futuro, marcadores moleculares dessa via poderão ajudar a selecionar quais pacientes se beneficiariam mais de inibidores de PDIA em conjunto com bloqueadores do receptor de androgênio.

Para médicos que lidam com oncologia, urologia ou genética do câncer, acompanhar essas descobertas ajuda a antecipar o que poderá chegar ao consultório em alguns anos – e a interpretar, com mais profundidade, laudos moleculares que já começam a mencionar alvos emergentes, mecanismos de resistência e novas combinações possíveis.

Assista em vídeo: fraqueza oculta no câncer de próstata

Referência científica

Xie J, Shen K, Liang W, et al. Protein disulfide isomerases regulate androgen receptor stability and promote prostate cancer cell growth and survival. Proceedings of the National Academy of Sciences of the USA. 2025;122(42):e2509222122.
DOI: 10.1073/pnas.2509222122.

Atualize-se em oncogenética e medicina de precisão

Descobertas como a de PDIA1 e PDIA5 no câncer de próstata mostram como a biologia molecular do tumor pode se transformar em novas estratégias terapêuticas. Para interpretar laudos genômicos, entender mecanismos de resistência e integrar esses achados à prática clínica, uma formação estruturada em genômica é fundamental.

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Conteúdo elaborado por:

Dr. Caio Robledo Quaio, MD, MBA, PhD
Médico Geneticista – CRM-SP 129.169 / RQE nº 39130

Dr. Caio
Robledo Quaio

CRM-SP: 129.169
RQE: 39130

Médico (90a turma) pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), com residência em Genética Médica pelo Hospital das Clínicas da USP e Doutorado em Ciências pela USP. Possui Título de Especialista pela Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica, Acreditação Internacional pela Educational Commission for Foreign Medical Graduates, dos EUA, Observrship em Doenças Metabólicas pelo Boston Children’s Hospital e Harvard Medical School e foi Visiting Academic da University of Otago, da Nova Zelândia. É autor e coautor de dezenas de estudos científicos em genética, genômica, doenças raras, câncer hereditário, entre outros temas da genética. Atualmente, é Médico Geneticista do Laboratório Clínico do HIAE e do Projeto Genomas Raros, ambos vinculados ao Hospital Israelita Albert Einstein, e Pesquisador Pós-Doutorando da Faculdade de Medicina da USP.

Dra. Helena
Strelow Thurow

CRBIO-01: 100852

Graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Católica de Pelotas, mestrado em Biologia Celular e Molecular pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e Doutorado em Biotecnologia pela Universidade Federal de Pelotas (2011). Realizou Pós Doutorado em Epidemiologia e Pós-Doutorado PNPD em Biotecnologia, ambos na Universidade Federal de Pelotas. Posteriormente, realizou Pós-Doutorado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo. Foi Analista de Laboratório no setor de NGS do Hospital Israelita Albert Einstein e atualmente é Analista de Pesquisa na Beneficência Portuguesa de São Paulo. Tem ampla experiência na área de Biologia Molecular e Biotecnologia.